OS ARRASTÕES DAS PRAIAS DA BARRA E DO FORTE
José Milbs de Lacerda Gama
As infâncias guardam fatos que nunca existiriam não tivéssemos o pensamento fixado em que sua perpetuação se fizesse presente no formato de uma crônica.
Como seria a historia de Macaé sem que fosse relatado as madrugadas dos arrastões das praias da Barra e do forte.? Pela madrugada, quando os barcos iam para o alto mar estenderem suas redes artesanais, era muito difícil, na volta, recolherem sósinhos cheias de possíveis peixes.
A solução era espalhar pelas cercanias que, quem ajudasse puxar os arrastões, poderiam pegar tantos peixes quantos pudessem levar pra casa. Claro que eram os peixes menores.
No dia de arrasto havia uma sinfonia comunicativa de boca em boca que circulava em toda a cidade e creio que isto acontece em todas as cidades a beira do mar. Gente avisando que, na próxima madrugada, haveria o tão esperado Arrastão.
Na praia da Barra tinha a presença marcante dos moradores. A família de Letício Ribeiro, o velho Deco, os filhos do Pai de Adilson e Walter Pereira, As tias e primos de Maria das Graças Franco, seus vizinhos, o Joaquim Lobo e todos os seus amigos que mais tarde o fariam vereador.
Os moradores da Boa Vista, Felix do Mercado, Sergipe, reunidos com os Barretos, capitaneados por Jajara, pai de Fernando e Claudia Barreto, eram avisados em primeiro lugar devido a proximidade com a Barra.
Os moradores do centro, Baeca, Buruca e periferia da Aroeira, recebiam a noticia que ia haver arastão através de Roberto e Ruy Mourão que fiziam a ponte entre a cidade e o bairro. Roberto foi um brilhante politico nos anos 60 e quase chega a prefeitura em 1962.
Na da Praia do forte, os remanescentes da Rua do Meio, cajueiros, Rua do Sacramento e morros do Carvão e Viaduto, tinha como avisante mor os Mirian Almeida e seus irmãos.
As lembranças ficam por conta de quem participava como Dabarra (da Barra), Paulinho irmão de Bonga e Léa, António Franco, Joaquim Lobo, Manoel Papagaio e seus irmãos, a filharada de Luiz Pinheiro, Os irmãos de Adilson Pereira , Baeca, os Barretos filhos de seu José Barreto, os filhos de Pastora, Felix do Mercado, Papa Lambida que comandavam as alegres madrugadas da Praia da Barra com gritos infantis e alegrias no enchimento de sacolas e sacos.
António Franco, que hoje é vereador e Pastor Evangélico, sempre levava para casa os sacos cheios de peixes que serviriam para longas e deliciosas refeições. Ele pode confirmar com detalhes vividos estes momentos extremamente macaense e puro.
Enquanto isso os arrastões da Praia do forte tinham dezenas de infâncias que hoje de cabelos brancos podem explicar o fenômeno maravilhoso que era esta pureza macaense. Tonho Lepra, Ecinho, Os filhos do velho Marins, Dabarrinha (da rua do Meio) Teteu, Telmo de Zica, Sylvio Araponga, Elmo de seu Pepeu, Zezinho Crespo, Cadinho e Ralph, enfim toda um gama de infâncias que faziam dos arrastões uma melodia de gritos e sentimentos de ganhos que transcendiam o puro apanhamento dos peixes para se tornarem uma glória só em participar de fatos pelas madrugadas.
Era como uma conquista sair de casa, agasalhar-se dos frios de Julho e Agosto e voltar com as medalhas orgulhosamente conquistadas na busca de redes e de peixes ainda pulando em querências e sofrimentos.
A gente até esquecia as preocupações maternas que nos acompanhavam os tímpanos com gritos até o portão.
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“Cuidado com os ferrões dos Bagres e dos Guris. Ainda é madrugada e vocês podem se ferrar”. A gente não estava nem ai. Muitos de nós se ferravam e quem tinha que nos atender era o seu Aluisio e “Juquinha” nas manhãs já de sol a pino na “Casa de Caridade”. A dor de uma ferrada de Guri só quem a teve que pode avaliar. Mas estas não impediam a nossa volta para os outros arrastões que eram aguardados com ânsia e desejo coletivo de todas as adolescências.
As crianças da Rua do Meio, além do autor, Claudio Moacyr, Telmo Azevedo, Levy Correa da Silva todos tinham, nas mãos e braços as fisgadas doloridas e de belas lembranças dos Gurís e Bagres...
As crianças são iguais em toda esta façanha movida pela conquista de horizontes novos e inexplorados. O “Arrastão” era esta conquista que a gente sabia ser algo mais que nosso. Era algo do coletivo do conjuntos de inconsciências. Algo que, involuntariamente criava uma socialização onde o trabalho de um tinha o esforço do outro.
Alguns gozadores teimavam em apenas segurarem as cordas num fingimento belo de um engajamento solitário. Só que os gritos uníssonos de quando se fazia o recolhimento das cordas não deixava que o malandro continuasse enganando. Era ai que a força ficava uma só e a rede vinha pululando com milhares de sardinhas, gordinhos, robaletes, peixe espada, parguinhos, guris, Bagres, pescadinhas, maimbás, cirys, camarões e outras dezenas que a gente ia catando enquanto os donos da pesca iam pegando os peixes grandes.
A volta para casa era um só festejamento, um linda voltar que nunca mais se ouve nas belas e virgens águas dos mares macaenses...
Sempre que podia as mães e avós nos presenteavam com os famosos bolinhos de comida feitos nas mãos que amassavam todo o conteúdo do prato. Até hoje busco saber porque as crianças comem todo o prato e repetem quando eles são feitos e servidos na mão das mães e avós. Seria o amassar da mistura que dava o sabor do desejante ou era mesmo a busca do avião imaginário ou do soldado que as crianças abriam a boca e o bocão e pediam mais?
Mas tarde , já na passagem de menino para jovem as crianças freqüentavam as tardes no “Lar de Maria” e podiam comer os Sonhos e Pastéis feitos também por mãos divinamente existentes na época e que a gente via sair das frigideiras quentíssimos. Era feitos por Dona Zenita, ora por Sula Viera, vez por outra por Madaí, servidos pela mãos de Vovô Idibaldo, que ainda moia o caldo de cana. Seu Pepeu, Peixotão e Ary, Nini irmã de Elmo e Voney, ficavam na espera para assumir o trabalho voluntário que marcou a existencia de muitos de nossa geraçao de jovens/meninos...
A noitinha, antes do Sol ir embora era trocar Gibi com Chico Gibi, Boca de Bagre e Lalá. Lalá sempre tinha grande coleção de velhos Rock Lane, Don Chicote e Fantasma que trocava na base de 3 x 1 desde que o Gibi fosse novo.
O velho “Nhozinho” Agostinho vendia as sobras que eram renegociados nas praças por centenas de crianças. Alguns até trocavam Gibi por Bolebas ou por Pião. Fato é que nenhum voltava para casa sem um comerciozinho artesanal. Muitos levavam espigas ou tombos dos mais malandros mais todos se alimentavam da bela ilusão infantil de ter tido novos contactos e novos amigos reais...
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