Boas vindas

Que todos possam, como estou fazendo, espalharem pingos e respingos de suas memórias.
Passando para as novas gerações o belo que a gente viveu.
(José Milbs, editor)

15.5.09

Das memórias de Dunga, Luiz Cláudio Bittencourt, que O REBATE publica...



A Foto que ilustra é do Zé Luiz que ainda mantem a simplicidade de uma existência herdada de sua infância em Itaperuna. Cercado de amigos ele ainda está firme e forte e se relaciona, com elegância, com a Mãe Natureza...

Luiz Cláudio Bittencort
, o nosso Dunga que também se assina como Izio Engo, faz parte das belas vivências da Região de Petróleo. Filho de meu amigo José Luiz Bittencourt que tinha um dos mais belos sorrisos que aportaram em Macaé, cidadezinha do interior do Rio de Janeiro. José Luiz era um caminhar sempre alegre e cumprimentativo que tanta falta faz neste frio mundo das virtualidades e progressos. Tinha nas plantas e na natureza fiéis parceiros. Muito tempo que não vejo o bom Zé Luiz...
Hoje, recebo com grande prazer textos de Luiz Cláudio, poeta, músico, amigo e grande momorialista. O REBATE faz presente as recordações de um belo tempo que todos temos nesta passagem terrestre. Poucos podem. como Dunga, velho participante do festival de Música de O REBATE nos anos 68, privilegiar-se destes feitos.
Com seu texto todos, independente de ser da região ou não, navegam no belo de um mundo que se abre a cada piscar de memórias...


Amigo Zé Milbs, obrigado pelas publicações dos meus textos. Realmente a grande intenção deles é simplesmente mexer com as lembranças das pessoas, foi um tempo muito bom !!!! Gosto da nossa cidade, gosto das histórias que as pessoas contam de seus tempos, e muitos guardam, guardam, e elas vão embora com eles. Estes textos foram escritos em 2002, em uma época difícil que eu estava passando, e resolvi fazer estas viagens. Ainda trabalharei em muitos outros e estou te mandando alguns que eu já havia soltado - são pipas !!!! Só para você fazer a sua viagem já que a nossa distância de idade é tão pequena.
Grande abraço e muito obrigado pelas publicações.
dunga

* O SACI E A JABUTICABA *


Era meados de setembro quando, num dia bem cedinho, cheguei lá no sítio e encontrei o meu pai, quase que de joelhos, a apreciar um pé de jabuticaba que ele havia plantado já há algum tempo. Fiquei intrigado! Estaria ele rezando aquela fruteira??? Nos cumprimentamos e aí perguntei o que estava se passando . Ele respondeu : - O cara, de quem comprei esta fruteira, garantiu que , com mais 5 anos , ela estaria dando frutos, mas, vigio, vigio, vigio, e nem sinal de nada, nem uma bolotinha verde colada ao caule. Aí, um desses capetinhas que vivem rondando a gente, veio ao meu ouvido e cochichou uma idéia que mexeu bastante com o meu lado moleque, mas, não passou disto, terminei a visita e fui embora.
Passaram-se alguns meses e, em uma outra ida ao sítio, percebi, junto ao pé de jabuticaba, um tomateiro anão repleto de tomates pequeninos e bem verdinhos, aí me lembrei do capetinha !!! E o pior, fui conivente com a maldita idéia !!! Catei um monte daquelas bolinhas verdes, arranjei pedacinhos pequenos de arame e, com uma tremenda delicadeza inspirada pela maldade, os colei no caule da fruteira. Até então, nem um bom dia eu havia dado ao meu pai, pois, o envolvimento com a cruel brincadeira não me havia permitido ainda. Cheguei perto dele e perguntei: - Zé, você já viu que a jabuticabeira frutificou ??? Ele olhou para mim e respondeu : - Você está brincando, Deus não seria tão bom para comigo, já estou convencido de que vou morrer sem vê-la frutificar !!! Você está errado, disse eu, ela está lotada de frutinhas !!! E que trabalho para colar aqueles todos tomatinhos no caule da fruteira , e a dor nas costas !!!. Zé largou o que estava fazendo e se dirigiu ao local, onde tantas vezes já havia ido, em busca de confirmação do que eu estava lhe dizendo. Quando se agachou de novo de joelhos junto ao arbusto, e viu aquele monte de bolotinhas verdes a enfeitar o caule, um pranto de felicidade nasceu naqueles seus olhos já com quase oitenta anos. Aí, fui apunhalado pelo remorso,e percebi, bem junto aos meus ouvidos, a risada cruel do capetinha, tanto pela mentira que o meu pai estava sendo vítima, como pela dor que se instalaria neste meu coração de filho mau, e que poderia durar para sempre. Passados alguns momentos, e com o meu pai já recuperado da emoção, fui obrigado a revelar a cruel brincadeira. O velho virou um bicho !!! Cerrou os punhos e desabafou uma bronca que eu já nem lembrava mais, bronca de pai zangado !!! E foi neste momento que o meu amigo HAIAIEL chegou junto ao meu outro ouvido e disse : - Não há uma justificativa correta para o que foi feito, maldade não se faz em hipótese alguma !!! Mas, tem um paliativo !!! O seu pai, na condição de grande gozador que também o é, depois da história que você vai contar, talvez ele releve, e aí a coisa poderá ficar mais amena. E deixei a idéia do meu amigo para depois, não era o momento certo, o velho estava bravo !!!
No outro dia, voltei ao sítio e percebi que a indignação dele estava mais suave, e resolvi arriscar os argumentos que o meu amigo anjo havia falado. Perguntei : - Zé, você se lembra quando eu, nos meus poucos 6 anos, escutei uma história, vinda de você, que o SACI PERERÊ existia e que era fácil pegá-lo ???? Fiquei curioso com a sua história e perguntei qual tipo de armadilha poderia ser usada para tal captura. Aí você foi mestre, tão cruel quanto eu, porque criança de 6 anos está diretamente proporcional a um velho de oitenta, em termos de inocência, um por ter vivido pouco, outro por já ter vivido demais. E você não perdoou !!! Explicou com precisão a fórmula mágica de como pegar o dito SACI : – Olhe bem , meu filho, pegue uma garrafa de cerveja vazia, lave bem lavadinha, arranje um pedacinho de repolho roxo e o coloque dentro dela, deixando-a destampada. No dia de lua cheia, coloque-a no fundo do quintal, só se pode deixar uma luz acesa, e, quando o relógio der meia noite em ponto, ele aparecerá e entrará na garrafa para comer a isca. Aí, é só correr e arrolhá-la. E, o mais importante, nem sempre ele vem na primeira vez, é preciso paciência e novas tentativas !!! E, com a mesma inocência que ele olhou os tomatinhos, eu fiquei meses, nos dias de lua cheia, a espreita de um SACI que nunca apareceu nem para dar boa noite. O fato é este, seu Zé, eu também já caí em uma de suas esparrelas!!! Acredite que não fiz a falsa frutificacão com intuito de vingança, mas, acho que estamos empatados!!! O velho sorriu de lado, bateu no meu ombro e falou : - Pois bem , continuarei na minha espera, quem sabe não viverei até aos 100 anos !!!!
Três meses depois, recebi um recado que era para eu ir urgente ao sítio, pois, uma grande surpresa me aguardava. Pensei em um monte de coisas e não cheguei a conclusão de nada que poderia ser uma grande surpresa, mas fui conferir. Chegando lá, fui saudado com um enorme BOM DIA, acompanhado de um sorriso largo. - Venha ver a surpresa que eu tenho para você. Comecei a segui-lo e percebi que se dirigia em direção ao pé de jabuticaba, pensei comigo, não pode ser !!! Tem molecagem aí !!! Mas, qual o que, eu sempre soube que Deus protegia, com muito mais carinho, os velhos, bêbados e crianças, e constatei!!! A fruteira estava lotadinha de grandes bolas negras, bem coladinhas ao caule e com todo aspecto de fruta bem doce, pasmei !!! Aí ouvi a voz do Zé, bem pertinho do meu ouvido, dizer o seguinte : - O seu Saci, continua solto e você com a garrafa atrás dele, acho que nunca vai pegar !!! Mas, na minha história, as jabuticabas saíram do pau e o senhor não vai provar nem umazina desta primeira safra, só no ano que vem!!!
Fiquei muito feliz!!! Tão feliz a ponto de fazer chover em meus olhos, e como agradeci ao meu amigo Deus. Tirei um grande peso da minha alma e, com a paciência necessária, aguardei pela próxima frutificação, e ela veio, tão certa como aquele homenzinho de uma só perna nunca entraria em minha garrafa!!!

Moral – acho que a minha pregação de tomates verdes, no caule daquela jabuticabeira, foi
um dos melhores trabalhos de acupuntura feito por um leigo!!!


IZIO ENCO
12/10/2003


O BACHAREL E A MELECA


Manhã de segunda-feira, sol brilhando no imenso céu azul e mar tranqüilo, um dia pedindo para ser dedicado à preguiça. Um jovem bacharel em odontologia desperta para mais uma etapa de serviços, veste-se impecavelmente de branco, só faltando turbante para ser confundido com um daqueles pais-de-santo famosos. Em seguida, sonolento ainda, dirige-se ao local onde pegaria a condução para o consultório.
Garoto novo, bonito, esguio, chamando a atenção das mulheres para a sua elegante postura de Doutor. Chega a condução e o alvo cidadão procura um lugar bem juntinho a uma janela e instala--se. A condução parte e, com olhos mais despertados, deixa que os seus pensamentos saiam pelo vidro e passeiem pelo horizonte marítimo, tendo a ilha de Santana ao fundo. Certa vez ouvi alguém dizer que homem quando fica com cara de bobo e olhar perdido no horizonte, com certeza está pensando em mulher. Mas, certamente, este não seria o problema do dia e que direitos teria eu para cogitar sobre os pensamentos do amigo, mas, que estava com cara do bobo, estava !!!!! Tinha gato escondido naquela tuba!!!
E lá foi o ônibus em seu trajeto, com o nosso personagem relaxado em corpo e pensamentos, junto àquela janela que mais parecia um televisor de tão interessante. Aí, sim, cometeu o pecado do dia na inocência de um gesto que jamais poderia ter sido público, e isto sem saber que estava sendo observado. Enfiou o dedão no nariz, aquele que abre a bochecha da gente para espiar dentro, e começou uma daquelas brigas, que todos conhecem e um dia já brigaram, com uma grudenta meleca adornada com um cabelo que saiu junto no momento em que foi arrancada. Depois de colocá-la para fora, passou da fase de briga para a de enrola-enrola, parecia mais estar tendo um orgasmo quando deixava a bichinha, já em forma arredondada, passear entre seus dedos.
Depois de alguns minutos já passados, sentindo que a dita cuja já havia perdido a consistência, colou-a na parte lateral do assento, retornando assim aos seus distantes pensamentos, aqueles!!!
Quase chegando próximo ao seu destino, uma senhora que, por não ter nada melhor para fazer, foi a observadora de todos aqueles malabarismos que ocorreram naquele canto de janela, sob a cor branca da limpeza. Deu sinal e desceu. Indignada com o que havia visto, e contam que ela estava indo a um dentista, não deixou por menos. Aproveitou o tempo em que o sinal fechado reteve a condução, caminhou até a famosa janela e, com o seu próprio dedo enterrado até as profundas do nariz, insinuou um gesto que qualquer um melecudo entenderia perfeitamente: - Tirando meleca, doutor??!! E com aquele olhar metralhante, de quem parecia mais ter visto uma cena de adultério, partiu para o seu destino: para as mãos do DENTISTA!!!
E lá seguiu o moço de branco para o seu consultório depois de não ter mais nada a fazer do que esboçar um sorriso, um tanto quanto amarelado para a profissão que exercia. Espertamente evitou conferir se outras pessoas também teriam sido testemunhas daquele ingênuo gesto matinal, e, com a mesma tranqüilidade que estava desde o início, retornou a sua janela, porém com as mãos cruzadas, e viajou novamente nas asas DAQUELES PENSAMENTOS!!!!!!!!!!!!

Izio Enco - 2002

*A ANTE-SALA DE RADIOTERAPIA *


19/05/2000 - AGUARDANDO A VEZ PARA TRATAMENTO DE UM CÂNCER ATRAVÉS DA RADIOTERAPIA.


NITERÓI (RJ) - (12:12:00 horas) - Acabei de passar pela rua Lara Vilella nº 191, lugar onde morei durante 5 anos e que foi um marcante ponto de partida para o meu alcoolismo. No local onde funcionava a pensão da Dona Ritoca está plantado atualmente um belo e luxuoso prédio. Sem muito sacrifício, consegui localizar o local exato onde ficava o porão que eu adorava ocupar, um úmido e mal ventilado espaço pequeno no qual morávamos em número de três. Lá o bicho pegava! Álcool, bolas, maconha, risadaria, violão, porradaria e, muitas vezes – lágrimas! Não senti saudade nenhuma quando passei por ali, foi um tempo ruim, um tempo perdido nos dois sentidos da palavra. Mas, não o foi por todo! Serve hoje como alicerce da minha sobriedade e felicidade, naqueles dias do passado eu era profundamente infeliz e sem um norte.
Aí, passei por onde foi o bar do Sr. Nelson e, hoje, como estava escrito lá: O BAR DO CEZINHA. Bem movimentado! Um grupo de estudantes tocava um pagode, muitas cervejas sobre as mesas, falatório alto e risos. Neste local, toquei muito violão, tomei muita birita, matei muitas aulas e não descobri porra nenhuma da vida. Não senti saudades. Talvez eu nunca mais passe naquela rua por livre escolha, ali fui profundamente infeliz e por muitas vezes pensei em suicídio.
Mas, lembro-me de um fato muito importante que ocorreu em minha vida ali naquele trecho de rua. Dizem que: - Se conselho fosse bom, não era dado, era vendido! Uma dessas burrices máximas que as pessoas não pensam antes de repetir. Ali, naquela mesa de bar e sem garçom, um amigo virou para mim e falou na bucha: Amigo, você não faz outra coisa a não ser matar aulas, tocar violão, fazer zueira dentro da pensão, arranjar confusão quando está bêbado, não dorme e não deixa dormir – e acha que vai ser médico?!!! Estão abertas as inscrições para o concurso do Banco do Brasil – isto em uma época em que os seus funcionários eram o seu maior patrimônio – porque não o faz?
Fiz, passei, fui trabalhar em São Paulo, e levei um bom período ganhando mais do que ele que havia se formado em medicina há pouco tempo. Que Deus o ilumine sempre por este conselho tão acertadamente dado, e ouvido! Essa foi uma das duas grandes curvas que mudaram o rumo da minha vida: esse conselho dado por um amigo chamado ROCK, e a outra foi quando um amigo oculto me sugeriu ir aos Alcoólicos Anônimos só para conhecer. Portanto, muito cuidado ao repetir as coisas sem pensar no que elas realmente querem dizer!
Hoje estou aqui, bem próximo deste local de ativa, cuidando de um câncer que está sob controle. Sou outra pessoa graças aos novos caminhos que busquei , encontrei e luto para me manter neles - os caminhos dos grupos de ajuda mútua. Sinto-me forte e orgulhoso! Luto com todas as minhas forças contra a morte e, se a ela sucumbir, será com dignidade e fé. Acredito na existência de um outro lugar onde as coisas devem ser mais claras. Tenho vomitado bastante por causa das seções de radioterapia e até andei reclamando com Deus. Mas, já parei. O meu câncer é muito leve em comparação ao que tenho visto por aqui, cresci! Viver é a maior das aventuras e desafios. Vez em quando, é bom que passemos pela corda-bamba, pois, ela nos leva a reflexões de crescimento, e como leva!

CONTINUO NA SALA DE ESPERA –
(12:28:00 horas) - Hoje vou para Macaé, ZUP!!!! Essa ida para a minha cidade é uma das máquinas que me impulsionam e serve de alento nas horas de solidão, dentro do apartamento no Vital Brasil, ajoelhado em frente a uma privada e botando os bofes para fora. Um momento de quase desespero. (O banheiro é a igreja de todos os bêbados, já dizia o CAZUZA em uma de suas músicas). Que bom que este tempo já passou em minha vida, reconheço-me um sóbrio vomitador! Mas não reclamo, só um pouquinho!!!. Sei que tudo isto é em prol de uma cura com a probabilidade de 99% de sucesso. Só para ilustrar: - além dos vômitos, estou com um dente inflamado e doendo, precisando fazer o canal. Uma distensão muscular que me obriga a andar igual a uma pessoa de 90 anos. Não é fácil, mas é o meu caminho! Podem ter sido causados pela terapia.

CONTINUO NA SALA DE ESPERA – (12:32:00 horas) – Passou um senhor com um aspecto horrível, agora começo a conhecer mais de perto as facetas do câncer, a dor e as depressões de alguns. O caso do senhor foi causado por cigarro, atingiu o pulmão e ele continua a fumar. Disto, o tabaco, eu também já estou livre. Emociono-me escrevendo. Paro, respiro fundo e contenho algumas lágrimas, tenho vergonha da emoção , que merda! A doença e o tratamento afloram por demais a nossa sensibilidade, tenho experimentado também uma leve depressão que não permito crescer em minha cabeça, procuro ajuda.

CONTINUO NA SALA DE ESPERA – (12:34:00 horas) – Aprumei de novo. Ainda tenho mais três semanas pela frente e preciso vencê-las custe o que custar. O bom é que tenho um PODER SUPERIOR que me ajuda e me inspira, aprendizados de ALCOÓLICOS ANÔNIMOS.
E a vida continua lá fora: - o fantasma de uma pensão que não foi escola, o grupo feliz de pagode tomando as suas cervejinhas, o cheiro que as ruas têm e não o perdem nunca, uma lista de nomes de pessoas que por ali passaram na minha época, e a imagem do prédio da pensão da dona Ritoca, junto ao Marília Mattoso.

CONTINUO NA SALA DE ESPERA – (12:38:00 horas) – E eu aqui esperando a minha vez, perdido em meus pensamentos e viajando nas asas da nostalgia. Depois, passarei pela sala azul e pelos sons da radiação. Em seguida, irei ao apartamento e, na solidão do banheiro, cumprirei a rotina do mal estar e vômitos. Aí sim, rodoviária e ZUP para Macaé!!! Com direito a dois dias de trégua!

CHEGOU A MINHA VEZ – (12:45:00 horas) - Lá vou eu, animado apesar de todas as dificuldades e incômodos do tratamento. Vou ficar bom !!!!!!!

Escrito na Rua Presidente Pedreira – Ingá – Niterói (RJ). Maio/2000
IZIO ENCO

Considerações de hoje: naquele quarteirão morei na pensão de dona Ritoca, nele o meu filho alugou um apartamento para morar assim que foi para Niterói, nele me tratei de um câncer e estou bom até hoje, nele comprei um apartamento no exato local onde foi a pensão, e nele, ao lado da pensão, fundou-se um grupo de ALCOÓLICOS ANÔNIMOS que já salvou um monte de vidas !!!!!! E ali, recebi um dos grandes conselhos de minha vida – e não foi vendido!!!!
Na época, o que muito me ajudou foram dois amigos de Niterói que marcaram presenças muito importantes nesta minha briga de talvez 50 dias. O meu eterno muito obrigado!!!!

IZIO ENCO / 03/04/2009


A PRIMEIRA TELEVISÃO
UM TRECHO DA MINHA VIDA – IZIO ENCO – 04/11/2002



Lembro-me, como se fosse hoje, do meu primeiro contato com uma máquina de diversão chamada - televisão. Ao lado de nossa casa moravam uns vizinhos muito especiais chamados: Dona Lili e Seu José Henrique. Ali funcionava a primeira garagem do Rápido Macaense, e esta companhia de ônibus pertencia a citada família. Tivemos também o prazer de sermos vizinhos do CAFÉ SÃO JOÃO, que também a eles pertencia e funcionava no mesmo local. Consigo, até hoje, me lembrar do cheirinho do café quando estava sendo torrado, passava certeiramente pela copa de nossa casa e alcançava o nariz da minha mãe que dizia com entusiasmo: - Vai lá comprar um pacote de café porque está saindo agora! E como éramos bem atendidos pela Romilda!
Mas, retornando ao planeta TELEVISIVUS e as minhas distantes recordações, eles foram os primeiros da rua a comprarem um desses aparelhos e, Dona Lili, com seu pequeno tamanho e bondade imensa, ligava para a casa de minha mãe (tel-349) e a intimava a mandar-nos até a casa dela para que assistíssemos ao Circo do Arrelia e desenhos do Pica-Pau. Depois, lembro que o Seu Landor (pai de Fred) também comprou um desses aparelhos e encontramos um segundo lugar para vermos também: Falcão Negro, Mike Nelson, Zorro e tantos outros programas em um encantador preto e branco absorvido totalmente pelos nossos olhares infantis.
E, depois de um bom tempo de filações, veio uma para a minha casa: - enorme e pesada, da marca EMERSON! Tão cheia de figuras aventureiras como as outras, e foi uma festa!
Eu gostaria muito que a Dona Lili e o Sr. José Henrique recebessem o carinho das minhas recordações como se fosse uma prece de agradecimento por estes inesquecíveis momentos de minha infância. Como é bom relembrar estas pessoas que tivemos o privilégio de partilhar, lado a lado como bons vizinhos, nesta estada no planeta. Que Deus os ilumine cada vez mais!

Observação: O Sr, Edmundo, pai de Tulucho, poderá ter sido o primeiro técnico em televisão na cidade de Macaé. Se estiver errado, que o dono da posição me perdoe!!!!
E me tornei um eterno viciado em televisão, essa grande companheira de tantos solitários!

IZIO ENCO

O MEU PRIMEIRO BEIJO DE LÍNGUA
UM TRECHO DA MINHA VIDA – IZIO ENCO - 04/11/200
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Aconteceu na casa do meu primo Tim Mosquitinho, em um dos seus aniversários quando eu tinha os meus doze ou treze anos, no dia 29 de junho em uma grande festa com foguetes, fogueira, batata-doce, bombinhas, fogos e tudo mais que o Tim e São Pedro teriam direito. O tio Julinho era muito animado para aquelas festas, botava para quebrar! A criançada se divertia muito, subiam balões, bombinhas explodindo no meio das pernas das velhas, e a coisa era muito boa. E foi com esta festa de fundo que aconteceu o meu primeiro e inesquecível beijo de língua.
Depois que eu já estava algum tempo por lá, avistei uma menina, talvez um pouco mais velha do que eu, com cabelos vermelhos e pele sardenta, que me olhava de um jeito gozado, eu era um verdadeiro boca aberta e custava a perceber quando alguma menina estava dando ponto! Mas, já gostava muito de meninas, e que não fiquem dúvidas! Aproximei-me dela e iniciamos um papinho inocente que acabou chegando a um jogo de purrinha, e valendo o que? Aí ela olhou bem dentro dos meus olhos e sugeriu: - beijos? Gostei da idéia e imediatamente começamos o jogo. Depois de uma rodada de dez partidas, nas quais eu havia sido o perdedor, ela cobrou o pagamento. Como estávamos em um lugar um tanto o quanto escurinho, juntos a uma parede de chapiscos que existe lá até hoje, não fiquei constrangido em pagá-la, e dei o beijo. Ela olhou com cara de surpresa e perguntou-me: - Que beijo é esse? O que você fez com a sua língua? Onde está o gato? Murchei um pouco e disse que aquele era o jeito que eu sabia beijar - encostando os lábios! Riu e me chamou de caipira. Ela era de Niterói, e perguntou se eu queria aprender a beijar de verdade. Nesse exato momento senti que, além de estar perdendo nos palitinhos, estava perdendo também em conhecimentos gerais - e topei! A ruivinha encostou-me contra a arrepiada parede já citada, colou aqueles lábios carnudos nos meus, juntou as suas cochas nas minhas, e enfiou uns trinta centímetros de língua dentro da minha boca, pelo menos foi esta a impressão que tive. E viajei!!!!!!!!!!!! Quando voltei daquela sucção tão gostosa, além das costas raladas pelas irregularidades do paredão, a minha cara deveria ser de quem acabara de testemunhar um milagre - abobado e quase nocauteado!
Recobrado os sentidos, esquecemos dos palitinhos e ficamos um grande tempo nos pagamentos, eram mais gostosos e eu havia aprendido com grande facilidade. Foi uma festa e tanto !!! Quando cheguei em casa minha mãe perguntou porque os meus lábios estavam inchados. Fui ao espelho e confirmei, talvez um grande excesso de sucções em prol de um aprendizado juvenil. Mas, para a minha mãe, foram as batatas quentes da fogueira! Nas costas, alguns pequenos arranhões deixaram grandes saudades, e a minha pintadinha professora acabou retornando para Niterói.
Trocamos algumas cartas, recebi cartões de natal, e cada um tomou o seu caminho, conforme a vida nos obrigou, ou escolhemos. Mas, em minhas recordações, moram até hoje lembranças de sensações como: - a esperteza daquela língua tão comprida a arregalar os meus olhinhos caipiras, a gostosa dor do seu corpo a me espremer contra aquele muro de chapiscos, a sedosa valinha que havia entre os músculos de suas costas, e da sua sedenta vontade de ensinar. E no céu, fogos e fogos! Tim Mosquitinho ficou mais velho e eu havia aprendido a beijar de língua, e que língua!!! Com movimentações tão precisas, capaz de causar inveja a qualquer lagarto!!!
Que Deus a ilumine em qualquer lugar onde esteja, pois, esses são os anjos que passam por nossas vidas e deixam marcas inesquecíveis.

Izio Enco

O MISTÉRIO DOS BEIJA-FLORES
UM TRECHO DA MINHA VIDA – IZIO ENCO - (04/11/2002)


Alguém trouxe, não sei de onde, uma história muito interessante que envolvia beija-flores e um desejo muito grande que vivia passeando pelas nossas cabeças, moleques de 9 a 11 anos, descobrindo os prazeres do TESÃO!!!! Contou-se que, se conseguíssemos matar oito pássaros daqueles, tirar as cabeças e torrá-las até que virassem um pó bem fino, havia um poder nisto que nos interessava bastante. A jogada era a seguinte: se você tivesse vontade de ter relação sexual com alguém, era só esperar esta pessoa fazer xixi, não dar descarga e, em seguida, você jogava o milagroso pozinho junto com a urina. Aguardava alguns minutos e, conforme o palavreado inerente ao assunto “JÁ ESTAVA NA RETA PARA SER COMIDA!!!!“.
E, baseado nestas informações, deu-se início a uma cruel caçada aos beija-flores. Conseguimos matar 16 (dose dupla) e, em seguida, partimos para torrar e socar. Daí para frente consistia somente em vigiar algumas dessas pessoas desejadas e os seus momentos de urinar, se a privada não desse o ronco tradicional do “vai pra baixo“, era só correr e jogar o miraculoso pó!!!
Até que um dia a coisa aconteceu. Um dos nossos disse que havia conseguido colocar o pó em um dos poucos momentos em que a descarga não roncou. Aguardou os minutos da bula e partiu para se esfregar na perseguida, com aquele tradicional papo de CERCA LOURENÇO. E deu certo, e alguém foi comido nesta história!!!! A sandália da mãe dele COMEU SOLTA no lombo do dono da poção mágica, depois da assediada ter reclamado e ameaçado ir embora. Logo após o acontecido, nos foram apresentados os vergões da surra e bem fresquinhos, só faltando a assinatura - “Havaiana”.
Diante de tal fracasso e já um pouco saturados por também apanharmos por outros motivos, jogamos os pós dos pássaros na vala da estação, só faltando as solenidades de pós-morte.
E novamente a paz voltou ao reino dos beija-flores, junto ao velho pé de manacá.

Izio Enco

O MENINO QUE TINHA MEDO DE GALINHAS
UM TRECHO DA MINHA VIDA - IZIO ENCO (04/11/2002)


A minha mãe era daquelas que não dava moleza para filho, a hora de ajudar, era a hora de ajudar! E não tinha conversa fiada! Algumas obrigações eram estabelecidas para mim como: varrer o quintal, tratar das galinhas, molhar as plantas, colocar os caixotes de lixo para fora, estudar e, depois de cumprir todas essas tarefas, poderia ir para os lugares onde a criançada se reunia para brincar – normalmente no maravilhoso campo de esportes que havia nos fundos do Matias Neto.
Com o passar do tempo surgiu uma outra obrigação e, com esta nova tarefa, passei a ter mais dificuldades em virtude de um item – ter que carregar as galinhas compradas na feira!!! Com os meus 11 ou 12 anos fui eleito o novo ajudante de compras na feira livre. Lembro-me que, uma das primeiras que tomei parte como ajudante oficial de compras, era localizada próxima a beira rio, ao lado da CERJ. Levantávamos cedinho, pegávamos um farrancho de bolsas, e partíamos para as compras do dia que, normalmente, era as sextas e sábados de manhã.
Aí, mamãe começava as escolhas – Vamos lá que os ovos de seu fulano são mais bonitos! A mandioca de seu cicrano é maior e mais macia! E eu chamava a atenção dela por falar desta maneira, e ela ria! Ali também nos divertíamos muito! Passávamos pela barraca de seu Isac e ele, com aquelas bochechas avermelhadas e cara de feliz, gritava – Ovo e uva boa !!! E as viúvas que por ali passavam entendiam – Ô viúva boa!!! E olhavam com cara de zangadas, mas, acho que algumas até se orgulhavam da observação! Até que chegava o momento mais complicado para mim, a hora de comprar galinhas! Mamãe sempre escolhia duas das bem pretas! Encostavam-nas no meu peito e dizia – Segura! E o medo que eu tinha daquelas merdas de galinhas! Atrevidas! Até a minha mão ousavam picar, e como eu suava frio! Aí começava a briga – Segura! - Não seguro! - Segura! - Não seguro! E eu acabava levando um cascudo na cabeça, e tendo que segurar aquelas duas galinhas que mais pareciam estarem sendo levadas para uma macumba. E terminava desfilando com aquelas duas belas companhias mais um tanto de horas. Aí descobri um macete, e quem passou a dar cascudos fui eu, nas galinhas, é claro! E, estas por sua vez, entendiam que era melhor para todo mundo ficarem bem quietinhas.
Mas, haviam coisas prazerosas também naquele fazer a feira. Ali, minha mãe comprou para mim os meus primeiros pés de orquídeas (um vício que está entranhado em minha alma até hoje). Comíamos sempre algumas bobagens gostosas como salgados e frutas. E passar pela barraca do seu Dengo! Eu tinha um olho comprido em uma coisinha dourada, de olhos azuis, que quase sempre estava lá a ajudar o pai. E ficava muito feliz quando a minha mãe parava por lá.
E depois, a feira foi se mudando para outros lugares, perdi o medo das galinhas, deixamos de ir a pé e passamos a usar a bicicleta e o carro. Chegou a hora de estudar fora e acabei perdendo o meu posto de ajudante oficial de compras, que eu já vinha ocupando por muitos anos. Tornei-me um parceiro e tanto da minha mãe!
E as feiras, com todos os seus participantes e entretenimentos, foram mudando de lugar, ficando espremidas, sendo derrotadas por novas modalidades de venda, quase só ficando nas lembranças de alguns saudosistas e no coração daquele menino que tinha medo de galinhas.
Hoje, quando passo por aquele pedaço de rua, consigo escutar os sons das ofertas, as risadas das pessoas, a gritaria das galinhas quando eram seguradas pelas pernas, e o mais importante deles: SEGURA ESSA GALINHA, menino cagão !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Homenageando: Isac, Dengo, Valdecir, Chico Bitu, Alfredo, Zé das Parasitas, e a tantos outros que ali – com dignidade – nos atendiam em festa e criavam as suas famílias.

Izio Enco


HI-FI INOCENTES BAILES
UM TRECHO DA MINHA VIDA – IZIO ENCO (04/11/2002)

Eram pequenos bailes que aconteciam nas casas, normalmente para uma garotada de 12 a 17 anos, com ponche e muita alegria. Em minhas lembranças o primeiro que recordo foi na casa da Ana Maria, filha do senhor José Honório, uma menina muito educada, carismática e inteligente. Lá conheci os primeiros discos dos Beatles, descobri que eu não sabia e nem gostava de dançar (o que acontece até hoje), que era um cara extremamente tímido, timidez esta vencida muitas vezes à custa de tanto álcool que acabei me tornando dependente (uma fatalidade que acontece muito na juventude e os pais deveriam sempre estar muito atentos). E estas festinhas aconteciam mais ou menos em 1965.
Estes pequenos bailes eram rodiziados em casas diferentes, inclusive na minha própria casa, regados também a ponche , salgadinhos, coca-cola, Roberto Carlos, The Fevers, Renato e Seus Blue Caps e Beatles, que ainda não deviam ter noção do quanto iriam significar e influenciar a juventude mundial e tantos outros cantores da época. Uma coisa que tenho muito orgulho é de ter tido a música dos Beatles como o mais presente fundo musical de toda a minha adolescência, não poderia ter acontecido coisa melhor, em época melhor!
Como foram importantes para mim estes primeiros bailes na casa da Ana. As primeiras paqueras, conversinhas nos cantos, os modismos da época (botinhas beatles, calça calhambeque, chapéu calhambeque, anel de carcará, mugui etc...) influenciados - como acontece até hoje - por vários cantores e artistas. E tudo mais que encantava os nossos mundos de crianças trocando de penas!
Infelizmente, a Ana Maria ficou pouco tempo em nossa companhia. Junto com a Sônia, irmã do amigo Roberto, perdeu a vida em um acidente quando fazia um passeio, se não me engano, a São Paulo. Um deslizamento de terra pegou a condução que elas estavam quando passavam em determinado trecho da estrada - na Serra das Araras. Mas as duas, com certeza, estão em um lugar bem melhor do que este onde vivemos nos dias atuais. Um lugar com canções tão belas como aquelas executadas em nossos pequenos toca-discos e que encantavam tanto os nossos corações de meninos e meninas despertando para a vida. Saudades da Ana e daquele tempo de inocência. Que seja permitido a elas receberem essa emoção tão gostosa que neste momento, ao escrever estas linhas, passeiam pelo meu coração de amigo saudosista.


CAÇADA DE RÃS E PESCARIAS
UM TRECHO DA MINHA VIDA – IZIO ENCO (04/11/2002)

Antes de me enfiar no mar atrás de peixes e lagostas, claro que influenciado como muitos daquela época pelo Mike Nelson (Aventuras Submarinas), dois dos meus esportes prediletos eram: pescaria de caniço e caçada de rãs.
As pescarias normalmente eram realizadas na vala da estação, cruzamento com a Rua Conde de Araruama, lado direito de quem vai para o Miramar. Ali ficavam uns oito moleques com os seus pequenos caniços a pegar piabas, mandis, cumbacas, traíras e acarás, sem contar que um de nós, vez em quando, despencava dentro daquela vala, não tão poluída como agora, mas, com uma água ainda limpa apesar dos esgotos que recebia dos bairros vizinhos. Além da pescaria, ficávamos também a conversar fiado - um infinito falatório de crianças, acompanhado de risos e provocações. Coisas de pixotes! E, entre um papo e um atrito, peixes eram fisgados e mantidos vivos em latas com água. - Se comíamos os peixes? Claro que sim! Esgoto naquela época não matava ninguém! Acho que os cocos eram mais sadios, coradinhos, menos cheios de química e até serviam de alimento aos pescados! Coisa ruim que acompanhava as pescarias era quando um dos mandis atravessava o ferrão no pé de alguém, que dor! E tinha que tirar na hora, na marra! Diziam que, se encostasse um cigarro aceso, o veneno era eliminado e a dor diminuía, mas, a da queimadura era claro que ficava! Trocávamos seis por meia dúzia! E estas foram as minhas primeiras experiências na a arte do pescar. Atualmente, quando passo por ali, estico os olhos em direção ao local e chego quase a escutar as inocentes e felizes risadas! Um bem adquirido e impossível de ser roubado - esta lembrança e a saudade que ela faz nascer!
Na caçada de rãs havia alguns macetes. Eu preferia caçá-las à noite, depois das chuvas e com lanterna (meu presente preferido nos natais, com ótima luminosidade e pega). As caçadas normalmente eram realizadas na vala que cortava o campinho do Seu Juca ou na vala da estação. Entrava-se na água (até o joelho) com a lanterna ligada, passos silenciosos, um barbante na cintura para servir de fieira e muita atenção. Era bem fácil pegá-las! Com o tempo, ficávamos ágeis como gatos e as fieiras, no final da noite, continham 20 ou 30 rãs PACUDAS (de tamanho grande e normalmente macho com grossos braços). Outra modalidade consistia em pescá-las no VIRADOURO DA ESTAÇÃO, com caniços e uma florzinha que era usada como borboleta de nome CU DE CACHORRO. Ao ficarmos sacudindo a flor, a rã pensava tratar-se de um inseto e a engolia com voracidade. Aí era só fisgar e cantar de bom! Mas, no fundo, a minha caçada predileta era nos alagados, com riscos de cobras e outros bichos peçonhentos. Certa vez enfiei a mão em num ninho de rã (formado por um monte de espumas que ela produz para colocar os ovos) e puxei uma grande surpresa: - uma linda cobra da água! O parceiro olhou para mim, franziu a testa, e adivinhou: - joguei no pescoço dele! Tomei umas duas porradas, daquelas bem nervosas, mas foi bom demais! O cara tinha pavor a cobras!

Izio Enco

JOGOS DE BOLA
UM TRECHO DA MINHA VIDA – IZIO ENCO (04/11/2002)


Na esquina da Rua Marechal Deodoro com Alfredo Backer, em um grande terreno ainda sem construções, próximo ao VIRADOURO DA ESTAÇÃO DE TRENS, ficava o nosso campinho de peladas. Hoje, esses campinhos foram ocupados por prédios e, em virtude do grande crescimento de nossa cidade, os moleques peladeiros não têm mais os espaços disponíveis que existiam naquela época, com vassouras que rasgavam os dedos dos pés, cacos de vidro jogados por moleques de outras ruas que queriam também ter direito ao nosso espaço. Mesmo com toda essa briga, era muito gostoso sabermos que aquele campinho era só nosso, e que poderíamos jogar bola a hora que bem quiséssemos!
Ali tentei encontrar a arte do futebol, mas, só jogava mesmo porque era o dono da bola, uma bolinha de couro número 1, novinha! Mesmo sem talento e só sendo escolhido porque era o dono da peça principal, tenho saudades daquelas partidas em dias quentes de chuva, nas tardes depois do colégio ou, quem sabe, todos os dias se as mães assim o permitissem.
Lembro-me que, certa vez, estávamos jogando uma partida quando chegaram uns homens de JEEP, com uma grande escada e hastearam em um poste de ferro, em frente ao nosso campo, uma enorme bandeira comunista. Isto deve ter acontecido pelo ano de 1962 ou 63. Pouco depois, veio o golpe militar e começou o “prende-prende”. Mas, de uma coisa tenho lembrança muito viva: - ficamos parados, quase hipnotizados, com o tamanho e cor daquela linda bandeira! Aí, poucos dias depois, vieram outros e a tiraram do poste. E a pelada parou outra vez!
Agora, voltando ao gramado, a minha carreira de jogador foi muito curta, não tinha jeito mesmo para a coisa, era muito ruim! Perna de pau! Foi aí que a substituí por pescaria de mergulho e violão, começava a encontrar os meus caminhos, comendo lagostas e tirando um terceiro lugar no Festival Estudantil Macaense de Música, tendo o pessoal do PASQUIM e Egberto Gismonti como jurados. A cantoria era mais fácil!
Outro aspecto interessante, quanto ao nosso campinho de futebol, era que, de vez em quando e como que num passe de mágica, víamos os ciganos chegarem e armarem as suas tendas coloridas ali, no nosso campinho! E isto virava festa para os moleques da redondeza! A gente ia para lá e procurava ajudar naquilo que era possível, mortos de curiosidade quanto àquelas pessoas. Lembro-me que certa vez, depois da cigana ter lido a minha mão, perguntou se eu não gostaria de fazer parte do grupo, o meu entusiasmo com aquilo tudo era muito grande! Lembrei-me das histórias, contadas pelos mais velhos, de ciganos roubando crianças e, para mim, a partir daquele momento, acabou a festa! Só reapareci no campinho quando as barracas dali já haviam desaparecido. Mas, que fofoca gostosa era ver aqueles ciganos em suas atividades tão diferentes para nós!
Hoje, eu consigo perdoar a um senhor que, certa vez, furou a nossa bola por ter caído na casa dele, não quebrando nada! Já devia estar saturado disto, entendo hoje! Ou não, como diz o Caetano Veloso! Foram 9 estocadas de canivete, na redondinha, aos olhos de uns 12 moleques, olhos que não queriam acreditar no que viam! E lá se foi embora a número 1 de couro! Tão redondinha e tão difícil para a época! Mas, vieram outras! Moleques dão sempre um jeito! Fica registrado, aqui neste texto, um perdão que o meu coração levou muitos anos para tornar verdadeiro, uma complicada e difícil partida de futebol, jogada por todos nós que somos aprendizes de uma arte maior que é SABER VIVER – e tentar perdoar sempre! (orientações do nosso TÉCNICO MAIOR). Mas, como somos humanos, certo dia minha mãe, que estava diretora do Jardim de Infância Ana Benedita, chegou para mim e disse: - Meu filho, hoje você foi vingado! E a sacrificada bolinha NUMBER ONE também! Aquele velho desgraçado, furador de bolas, foi de PIJAMA pegar o seu neto no Jardim de Infância, e quem estava na porta? Eu! E disse a ele com educação e firmeza: - Por favor, meu senhor, aqui não se entra de pijama! Essa é uma escola pública e não um dormitório. Ele resmungou, raspou o pé no chão, e teve que aguardar a entrega do neto do lado de fora. Dona Yvone - O AZ JUSTICEIRO!
Agora, aproveitando a deixa desta mágoa perdoada, quero me lembrar de um fato que também marcou muito a minha infância, e de outra maneira – feliz! Aos 7 anos entrei para o grupo de Lobinhos na sede do Tênis Clube, época em que estavam desmantelando a antiga e construindo a nova. Nesta época não era fácil conseguir mochilas, cantis e outros artefatos – todos necessários para que realizássemos as nossas caminhadas: - Sítio de Dona Cedália, Fazenda do Zé Machado, Sítio do Newton Luz e outros tantos lugares. Aí entra em cena o Tenente Célio (doente nos dias atuais, e por quem peço sempre ao Criador pelo bem estar dele, relembrando o grande gesto que ele teve para com um garoto eternamente grato). Ele conseguiu para mim, a pedido do meu pai, uma mochila, um cantil e um embornal – DO EXÉRCITO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! Ele talvez não tenha tido noção do quanto me fez feliz, que Deus olhe por ele sempre!
Pensem muito bem antes de cometerem qualquer coisa contra os pequeninos. Crianças são crianças, e não podemos esquecer que também fomos um dia, com todos os direitos a fazermos coisas erradas, peraltices da idade, e sermos orientados e perdoados.

Izio Enco



Alcione, não lembro o nome, Dunga, Catita, Wilson (da imobiliária), Marcos Peri, Fred Cabeção, Dona Maria Helena, Luiz César Mendonça, Farah, Luiz Luz, Marcos
Homero e Joel Ribeiro. Um tempo feliz, muito feliz!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!


GUERRAS E DISPUTAS
UM TRECHO DA MINHA VIDA – IZIO ENCO (04/11/2002)


Existia uma rivalidade entre os garotos da nossa rua com os da Aroeira e Miramar. Marcávamos guerras e estas normalmente eram travadas no CAMPINHO DO SEU JUCA. Este campinho era formado por enormes terrenos que se ligavam e ia da Rua Alfredo Backer até Conde de Araruama, cortado por uma vala onde também fazíamos as nossas caçadas de rãs em dias de chuva. Este espaço ficava compreendido entre as casas do Seu Juca, Tide, Dona Maria, Dona Emilinha, Seu Paulo, Seu Zequito e Seu Toledo. E aí estava o nosso campo de batalhas, o da turma da Rua Alfredo Backer.
As armas eram: arco e flecha, estilingue com cocos de mamona ou bolinhas de barro cozidas ao sol, besta e pedras de mão. E, de uso destes armamentos, os confrontos eram travados sem grandes machucados, só vergões! Mais uma vez estava Deus presente! Certo dia, durante um desses confrontos, ouviu-se um tiro com fumaça de pólvora. Um dos garotos da outra turma havia usado um CATAFEIXO (pequeno revólver feito com cano metálico de guarda-chuva ou cobre, pólvora, espoleta e, o pior: o projétil!). Mas, por sorte e PROTEÇÃO, ninguém foi atingido. Aí, pensamos em fazer um canhão. Compramos a pólvora facilmente de um comerciante local, arranjamos o tubo metálico, montamos a estrutura, e partimos para a experiência. Com que se seguiu: - um pedaço de muro destruído, um dos nossos guerreiros chamuscado de pólvora, chegou-se a um acordo tribal de que era extremamente perigoso e podendo causar danos irreversíveis!
E, diante de tão perigosos artefatos bélicos, as guerras de ruas foram caindo no esquecimento, e o PAI mais uma vez suspirou aliviado!
Moleques são moleques enquanto houver gente sobre o planeta!

Izio Enco


A VIAGEM EM TREM DE MADEIRA PARA ITAPERUNA -RJ
UM TRECHO DA MINHA VIDA – IZIO ENCO – 04/11/20
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A viagem no trem de madeira para Itaperuna – Sim, essa era uma viagem e tanto! O meu avô Júlio vinha passear em Macaé e, na volta, eu ia junto para Itaperuna passar uns dias na casa dele. O retorno era em um trem de madeira, puxado por uma Maria Fumaça cuspideira de fuligem que, além de balançar muito, fazia um monte de paradas para baldeações e comilanças, e aí estava a grande festa da viagem! Em cada estação que parávamos nos eram apresentados um monte de petiscos como: peixe-frito, pastel, milho-cozido, pamonha, papa-de-milho, preá frita, laranja, vara de mexericas, caldo-de-cana, e mais um monte de coisas pedindo para serem mastigadas. Ah! Também eram vendidos muitos passarinhos como: canários, papa-capins, melros, tizis, bicos-de-lacre, avinhados e etc... E a viagem, em virtude de tantas paradas para alimentação, manutenção, interrupções na linha, abastecimento de água, fazia com que este percurso tivesse a duração de um dia inteiro. Isto sem considerar que, a distância que separava Macaé de Itaperuna naquela época, parecia muito maior que agora, velhos e bons tempos! E, para tornar essa grande aventura mais agradável, a nossa maior diversão era mesmo mastigar, mastigar e mastigar! E pra mim, mastigador nota dez, o final era sempre uma colicantíssima dor de barriga , daquelas que faz arrepiar até a alma, suar nos dentes e chorar pelos cabelos!!! Aí, entrava em cena o vaso sanitário do trem, com uma dura tampa de madeira de cor esquisita, vazado direto até aos trilhos, onde todo o produto final da minha exagerada gulodice caía diretamente na linha. E, a partir deste ponto, começava o meu inferno astral, o medo de vazar também por aquele buraco e cair, junto com o cocô, entre as pedras que sustentavam os trilhos. Mas, sempre fui valente, nunca deixei de comer por intimidação daquele nojento vazo. E lá ia eu com o meu avô, debruçado em uma janela ainda isenta de pedradas, a apreciar as coisas belas da viagem, o ziguezaguear de alguns rios que margeavam o caminho e o imenso verde que compunha a maior parte da paisagem.
E, depois de tanta aventura, chegávamos naquele trem sorridente e lerdo em uma cidade quentíssima que eu amava e ainda amo muito, pois, lá estavam os meus avós paternos e tias que, sem dúvida nenhuma, sabiam me agradar e muito! Ainda hoje consigo tirar de dentro das minhas lembranças aquele longo piuiiiii que tanto se repetia no percurso, produzido por aquela grande engenhoca de ferro que, cuspindo vapor pelas ventas, nunca deixava de chegar àquele destino tão ansiosamente esperado pelo meu coração de criança saudosa. Bons tempos!
A benção, meus avós!
Que saudade!

Izio Enco



UM TEMPO DE ÁGUAS LIMPAS
UM TRECHO DE MINHA VIDA – IZIO ENCO (04/11/2002)



Fazia parte de nossas diversões tomar banho de rio próximo ao Mercado Municipal ou no canal que ligava Macaé a Campos, em uma ponte perto de onde atualmente funciona o batalhão da Polícia Militar, na Barra de Macaé. Este segundo local também era conhecido como as comportas do campo de aviação, muito bom para pescarias de caniço (piabas, acarás, traíras, e outros peixes) ou, com puçás feitos de sacos de arroz para pegar camarões pitus. Neste tempo, a água do canal era incrivelmente clara, com uma areia branca no fundo e plantas aquáticas em suas margens, parecendo mais um GRANDE aquário.
A muralha do rio junto ao mercado de peixes também fazia parte do roteiro de nossos banhos, mas, ali a coisa era um pouco mais perigosa. Neste tempo, em virtude do rio ter muito mais água que agora, havia uma correnteza e o desafio era atravessá-lo, conseguindo chegar até o pontal. De vez em quando um dos moleques era carregado para dentro do mar. Aí, como não faltava no lugar, aparecia sempre um bom pescador para resgatá-lo. Outro desafio que também fazia parte da festa era saltar sobre a muralha, executar um canivete no ar, e cair certinho de cabeça naquela água ainda limpa e quase sempre morna. Eram tardes felizes onde luzes da alma se misturavam com a cor dourada do sol da tarde, e que gritaria festiva aquela molecada fazia! Nesta época, havia bem menos barcos no cais e, com isto, o nosso espaço para os banhos era também maior. Quando o mar se misturava com as águas da foz do rio, aparecia um tom esverdeado mais limpo e belo, e cardumes de sardinhas apareciam para serem pescados até com iscas feitas com papéis de cigarro, a parte brilhosa.
São lembranças de tardes inesquecíveis que nunca mais voltarão. A atual água pastosa e suja do canal, repleta de esgoto do PARQUE AEROPORTO e lixo, jamais voltará a ter o encanto e beleza de antigamente. Não acredito em nenhuma administração que consiga fazer este milagre! O rio Macaé, já quase sem água por falta de cuidados em geral, virou um grande depósito de lixo. Suas matas ciliares foram devastadas totalmente para serem substituídas por grandes pastos, onde teria sido tão fácil preservar alguns metros para proteção destas margens. Acabaram com o seu zigzaguear tão importante em termos ecológicos, onde pés de jamelões e ingás faziam a contenção de suas margens. Transformaram o seu curso em retilíneo - que crueldade! Que falta de percepção!
Atualmente, é um rio triste. Sem os grandes robalos de antigamente, sem os cardumes de sardinhas, com um cheiro ruim e, o pior, sem a festividade aquática daqueles moleques nas tardes quentes de verão. Só um milagre de Deus! E eu acho que ELE já está se cansando da ignorância e egoísmo dos homens, está deixando rolar! Olhe bem o que já estamos colhendo.
A vida é pura física! Esteja sempre pronto para receber de volta, e com mesma intensidade, tudo aquilo que você mandar! Talvez falte a muitos a noção exata do grande comprometimento que é administrar.

Izio Enco

CARTEIROS DA MINHA RUA
UM TRECHO DA MINHA VIDA - IZIO ENCO – ( 04/11/2002 )



Aos 13 anos comecei com as namoradinhas e, como Macaé era uma cidade turística naquela época, algumas delas eram de outros lugares. Normalmente eram namoricos de carnaval e férias e, quando esta moleza acabava, o caminho era o das cartas, e a expectativa de esperá-las chegarem pelo correio era muito grande. Aí entraram em cena duas pessoas que marcaram muito a minha vida nesta época, os carteiros FABIANO e ELMINHO. Entre 15:00 e 15:30, era a hora certinha em que o trinco do portão fazia barulho e eu, garoto vivendo as primeiras paixões, corria para conferir a chegada do carteiro. O Fabiano, por já ter percebido a minha ansiedade e expectativa, do portão mesmo ele já acenava com a cartinha na mão. A porta era rapidamente aberta como se um relâmpago houvesse passado por ali, e, com mãos ligeiras e coração a mil, segurava aquele envelope bordado de verde e amarelo. O Fabiano era um sacana, quantas vezes acenou com envelopes que não eram para a minha casa e, quando eu chegava perto, com um sorriso cínico no canto dos lábios dizia: - Olha que eu me enganei!!! Ele já está entregando cartas para São Pedro e deve ter levado junto o bom humor e simpatia de sempre. O Elminho continua vivo e freqüentando alguns lugares que eu também costumo ir. Sempre ao vê-lo lembro-me imediatamente daquela expectativa gostosa em escutar o trinco do portão abrir e alguém gritar – CARTEIRO!!!
O cheiro das cartas – cada uma delas tinha o seu próprio cheiro – e que saudade !!!!
Recebia, olhava, apalpava, cheirava, admirava e, só depois de todo esse ritual, abria. E bebia as frases, saboreava os entre vírgulas, lia várias vezes as palavras carinhosas, e o mais importante, com esse mesmo coração sensível que consegui manter vivo dentro do meu peito até hoje. Que privilégio !!!!!

Izio Enco
-Publicado em Maio de 2009 por José Milbs de Lacerda Gama, editor de www.jornalorebate.com em honra e homemagem ao Luiz Cláudio -Dunga - Bittencourt

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